06 junho 2006

Caixa de Clips 004 - David Bowie / Be my wife

E ao quarto vídeo, aparece o homem que durante toda a década de 70 esteve no olho da tempestade, no centro do furacão, no epicentro do terramoto. O artista sem o qual o glam não teria sido glam, e portanto o punk não teria sido o mesmo punk, sem o qual os new-romantics teriam sido diferentes e o synth-pop mais aborrecido. O músico sem o qual a música de hoje seria muito diferente, de certeza que para pior. Quem conhece os meus gostos, por me conhecer ou por costumar passar aqui pela C-70, já desconfiará porventura que este cavalheiro é a minha maior referência musical. Não se enganou.
Como já disse, esta rubrica da C-70 pretende mostrar clips representativos da era 77-83, talvez o meu periodo preferido da pop. O clip que escolhi praticamente inaugura a era, mas não parece. É de 1977, um ano de colheita ímpar em que deste lado do Atlântico se editaram os primeiros discos dos Sex Pistols (neste caso, primeiro e único), Clash ou Damned e em que Brian Eno gravava Before and after science. O mesmo ano em que, do lado de lá, os Ramones editaram Leave Home e Rocket to Russia, os Talking Heads e os Television gravaram as suas estreias, 77 e Marquee Moon, e Richard Hell e Johnny Thunders editavam, respectivamente, Blank generation e L.A.M.F. Um ano, portanto, do caraças!!
Nesse ano incomparável, houve uns mais activos do que outros. E um dos mais activos foi com certeza Bowie, que não se limitou a editar um disco. Editou dois, e que dois - Low e "Heroes". Mas fez mais: produziu e co-escreveu outros dois com Iggy Pop, seu amigo de longa data e camarada de exílio na cidade do Muro. E que dois - The Idiot e Lust for Life. Apenas quatro dos melhores álbuns da década, todos de 1977 e todos com uma intervenção directa do Thin White Duke. Estranhamente, este período de hiper-actividade é descrito pelo próprio como um dos piores de toda a sua vida - daí o nome Low. É caso para dizer "deprime-te mais vezes, homem!".
Be my wife, a música que podem ouvir já qui em baixo, é uma espécie de elo perdido entre os Roxy Music e os Pixies. Não soa a 77, tal como Marquee Moon (onde não destoria) também não. Vai beber ao glam e projecta o rock dos 80's. É um hino ao desespero de quem tem o mundo aos seus pés mas não consegue dormir, o grito de quem está completamente sozinho no meio de uma multidão que o idolatra. Um haiku sobre a condição humana. Um Citizen Kane proto-punk em três minutos.
E é também uma das minhas canções preferidas. Enjoy!



PS - Como brinde inteiramente grátis, ficam os links para uma canção de cada um dos outros três álbuns deste período ("Heroes", Lodger e Scary Monsters). A versão de Heroes não é a original, que toda a gente já conhece e que tem um péssimo clip, mas uma outra gravada para o programa de Natal de Bing Crosby em que Bowie fez uma inesperada aparição.

"Heroes" (1977)
Look back in anger (1979)
Fashion (1980)

3 comentários:

Ricardo Salazar disse...

és lindo, és divino, és grandioso!!!!

esta prosa quase que me levava às lágrimas se eu tivesse coração.

obrigado meu bom homem...obrigado.
vou ouvir db.

a minha favorita do low é..always crashing in the same car... ( só hoje me lembrei que não tenho carta e adoro esta música )

P.S. db parece um símbolo gráfico para pénis.

Anónimo disse...

Este ano foi realmente brutal. Lembrei-me agora que o primeiro dos "Suicide" também é deste ano. Passo-me com este disco...
j.g

Joe disse...

deverias então ter estado na FNAC na passada quinta feira entre as 6 e as 7, onde Herr Salazar e eu próprio apresentámos a 1ª sessão Radioland, dedicada aos 70's - mais propriamente, "do glam ao punk". Passou uma música desse disco dos Suicide, no meio de uma magnífica banda sonora que começou com os T-Rex e acabou nos Joy Division e que era colorida com pequenos comentários e histórias.