É triste, mas é verdade: apesar de me esforçar, não consigo fazer que os portugueses dêem o devido valor aos Doves. Pelo menos aqueles a quem, bem intencionado, emprestei o excelente "Lost Souls", ou este ainda melhor "The Last Broadcast". Por alguma razão o rock semi-épico, saturado de guitarras e tributário dos Radiohead deste trio de Manchester não convence os rockómanos tugas. E não estamos a falar propriamente de uma pequena banda de terceira divisão. Os Doves são "habitués" das tabelas dos melhores do ano, esgotam digressões no Reino Unido e nos USA, e o álbum que se apresenta à vossa esquerda entrou directamente para o primeiro lugar do top inglês. Mas por cá ninguém lhes liga puto. E esta, hein?
Os Doves situam-se, em traços largos, naquela franja da britpop vinda após o sucesso mega-galáctico dos Radiohead, que mostrou que os discos de temáticas depressivas, composições cuidadas e arranjos sofisticados estavam novamente a vender que nem nem pãezinhos quentes, ainda que proviessem de bandas com vocalistas feios como a noite. É nesta linha que nos últimos 7/8 anos têm aparecido produtos como os soporíferos e ultra-sobre-cotados Coldplay, os chatos Starsailor, os insuportáveis Muse, os mariquinhas Keane ou os fugazes Travis (lembram-se?). Nada de que os Radiohead se possam orgulhar, e com certeza muito que terão a explicar quando o Altíssimo os chamar a prestar contas.
No meio desta tropa fandanga, surgem os Doves. Sem paneleirices, com um pop-rock directo, com atitude e com grandes canções. Com blusões e kispos apertados até cima, a barba por fazer e cara de quem toda a gente lhes deve e ninguém lhes paga, têm o ar de quem acabou de sair da fábrica e se encaminha para o pub para despejar duas ou três pints antes de regressar à casa no bairro social dos subúrbios, onde os esperam a mulher gorda e mal arranjada e os 4 filhos ranhosos e malcriados. São um produto da classe operária (devem neste momento estar a sair para a rua para uma manifestação do Labour day), não uma boys band estilizada. Mas são do melhor que a Inglaterra musical tem dado nos últimos anos.
O primeiro álbum, Lost Souls, saiu em 2000 e conquistou-me imediatamente para a causa. Foi comparado ao seu contemporâneo Parachutes, dos Coldplay, mas ganha-lhe em todos os aspectos por KO ao primeiro round. Canções como The sea song, Here it comes ou a gloriosa Catch the sun não saem da pena de qualquer Chris Martin.
Mas é neste segundo The last broacast que os Doves revelam a grande banda que são. Com um som mais rico e mais intenso que o seu antecessor, com melhores canções e com um maior sentido de álbum, foi um dos grandes discos de 2002. Tem um início poderosíssimo, com as magníficas Words, There goes the fear e M62 song. A partir daí vai desfiando uma série de pequenas perólas pop, de que me permito destacar N.Y., Pounding ou Caught by the river. Nota-se um maior cuidado nos arranjos das guitarras (aqui e acolá a lembrar os melhores Verve) e das segundas vozes, fazendo-nos reparar melhor na excelência do trio enquanto compositores e produtores.
No ano passado os Doves editaram Some Cities, o seu terceiro álbum de originais. É um disco mais directo do que os anteriores, com uma batida mais forte, e que apesar de revelar uma ligeira mudança de rumo de forma alguma desmerece o passado, tendo entrado na minha lista dos melhores de 2005. Mas este continua a ser o meu favorito do trio de pedreiros sensíveis e mal amanhados. Descubram-no.
3 comentários:
Concordo inteiramente. Não entendo porque eles passam ao lado de tanta gente em favor dos insossos Coldplay e afins. Que se lixe! Gosto muito destes pombos e ponto final!
Por acaso gosto bastante deles. Acho este album agradável mas muito inferior ao de 2005. Há uma ou outra música que se destaca, lembro-me agora da "there goes the fear". O Some Cities é um album francamente bom, com várias músicas francamente boas.
Obrigado por intiresnuyu iformatsiyu
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